O trabalho de reconstituição da história da filosofia na Antiguidade se confunde com aquele da investigação sobre os processos de transmissão, de recepção e de discussão dos textos. E, no caso dos Pré-Socráticos, isso se traduz no exame crítico dos testemunhos e comentários gerados no contexto da discussão de suas teses e dos fragmentos de obras originalmente elaboradas nos duzentos anos da primeira idade da filosofia grega, e citados ao longo de pelo menos um milênio por diversas gerações de autores antigos que se debruçaram sobre o seu pensamento. Estas são as nossas principais fontes para o estudo deste período da história do pensamento antigo: graças a esses autores dispomos de um material literário responsável por consolidar um rico e complexo fenómeno de recepção que permitiu, historicamente, a efetiva constituição de um legado dessas obras perdidas em sua original integridade. Nesse processo de transmissão, pelo menos duas perspectivas se distinguem e se complementam: aquela da historiografia filosófica e aquela da doxografia. Diante delas, uma habilidade se delineia e se impõe ao estudioso dos primeiros tempos da filosofia: é preciso saber ler os textos. Isso pressupõe, entre outras coisas, que se dê a devida atenção ao contexto em que cada fragmento de pensamento foi transmitido (quando isso é possível) e à discussão suscitada pelas teses nele expostas, à intertextualidade de cada uma das fontes de que dispomos para abordar um determinado pensador e suas ideias, além de um cuidadoso manuseio das ferramentas da paleografia e da filologia. Uma obra em particular foi responsável, no início do século XX, por atrair a atenção dos estudiosos para esse período da Filosofia Antiga. Trata-se dos Fragmente der Vorsokratiker,de Hermann Diels, coletânea posteriormente revista e incrementada com as contribuições de Walther Kranz. A coletânea por eles estabelecida se tornou uma primeira referência para os estudos que se seguiram sobre um ou outro autor, sobre uma ou outra tradição do que se convencionou denominar de «filosofia pré-socrática». Com efeito, para além do terreno das traduções e do estabelecimento de texto das coletâneas dos Pré-Socráticos, o âmbito dos estudos consagrados aos primeiros pensadores da tradição filosófica vem assistindo nos últimos anos a um crescimento significativo do número de pesquisadores, estudantes e professores que passaram a se interessar e se ocupar, de maneira mais direta e duradora, do pensamento filosófico desse período da Antiguidade Grega, que se inicia na transição do século VII para o VI a.C. e se estende até o século V a.C. Em toda a América Latina dissertações e teses, artigos, livros e capítulos de livros vêm sendo dedicados aos principais representantes deste período, abordando uma grande variedade de temas e problemas, e adotando diferentes perspectivas metodológicas, contribuindo para fomentar uma comunidade de estudiosos votados a este campo de estudo e pesquisa, que vem se consolidando nos últimos anos e se encontra em franco movimento de expansão. Os textos são apresentados na língua original e traduzidos para o inglês.